25/04/2008

Zeca Afonso como nunca o ouviram | Jornal "Público"

Pode A morte saiu à rua ser, afinal, pop swing? Nas mãos de Rafael Fraga, sim, como se vai ouvir esta noite no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Ao todo, são 20 canções de Zeca Afonso interpretadas por 11 músicos (vozes, piano, saxofones, guitarras, baixo, bateria, percussão e um quarteto de cordas), a partir de arranjos de Rafael Fraga, que partilha a direcção musical com o pianista João Paulo Esteves da Silva.

Músico e finalista de Composição, Rafael ainda não era nascido a 25 de Abril, o dia que este concerto comemora. Tem 30 anos, o que significa que tinha cinco quando Zeca Afonso actuou, doente, em 1983, no Coliseu de Lisboa. Mas essa noite, como toda a música de Zeca, é uma herança de família. "O meu pai assistiu disfarçado de segurança para poder ficar em volta do palco, e foi uma das pessoas que no fim o ajudaram a descer. Sempre conheci a música de Zeca Afonso em casa."

Filho de um faialense e de uma micaelense, Rafael cresceu em Lisboa e Ponta Delgada. Há outros músicos açorianos no projecto e o técnico que vai gravar o concerto de hoje também veio dos Açores. "Se o registo ficar apropriado, ponderamos editar."A ideia de 20 Canções para Zeca Afonso foi lançada em Janeiro de 2007. Em Abril e Maio o grupo actuou em Tondela e Castelo Branco.

Este terceiro concerto é, pois, a estreia lisboeta, com duas novas canções, O que faz falta e Canção da paciência. "A ideia do espectáculo é ser dinâmico ao longo do tempo. Quem o vir mais do que uma vez não ouve sempre as mesmas canções. O Zeca tem um reportório tão extenso que podemos ir rodando."

Isto também permite a Rafael contrariar um espartilho: "A música continua confinada a rótulos. Um dos problemas da música erudita é um grande desfasamento entre as salas especializadas e aquilo que o público ouve. Por isso é muito interessante encontrar uma linguagem que englobe elementos de jazz, erudita, popular, africana, que o Zeca, de uma forma intuitiva conseguiu incutir na sua música. A obra dele é muito assertiva, objectiva, define claramente objectos que podem ser transformados noutras coisas."

Tão transformados que um colaborador de Zeca - João Luís Oliva, produtor no álbum Galinhas do Mato - exclamou, depois de ouvir 20 Canções: "Não lembrava a ninguém, isto de transformar A morte saiu à rua num pop-swing...!" - ao mesmo tempo que "grangeou elogios rasgados ao arranjo "beriano" de Adeus ó Serra da Lapa", escreve Rafael Fraga no blogue do projecto. No mínimo será Zeca Afonso como nunca o ouviram. A.L.C.

in Jornal "Público"
25 de Abril de 2008

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